Mas...
Sempre o “mas”, ouso dizer que, há tempos, me assolam versos magníficos de um
poeta, digamos assim, doméstico, de seu poema Criatura e Criação:
E
agora, homem ingênuo, louco ou poderoso,
Agora
que por tudo isso exististe,
Tu
te fizeste um colosso,
Mas
também te fizeste triste.
Triste? Não!
Colosso!
Esta geração
explode em energia e vigor. Nunca viveu tão extenso período de prosperidade
material e de paz; tem, ao alcance das mãos o que desejar, já que tudo está
pronto para o uso, tudo perfeitamente posto. Pode sonhar e até mesmo
não-sonhar. Sua estética já superou todas anteriores, tanto que construiu uma antiestética,
a antimúsica, a antipoesia, antiarte, e injetando nisso valores exóticos.
Triste.
O consumo
passou a ser sua necessidade essencial, e a humanidade é capaz de desejar
estranhezas como cores novas para cafeteira que requer capsulas indestrutíveis,
enquanto debate a produção de canudos de bambu, para o bem do meio ambiente.
Simbiose de ignorância e cinismo. E desejos realizados devem ser, necessária e
acintosamente, expostos nos ambientes retos, secos, frios, de uma estética sem
memória.
Colosso.
Geração
colossal que cruza oceanos em céus nunca antes avistados. As velhas espirais metálicas agora dispõem de
som e imagem, a odisseia humana extrapolou há muito o computador que levou o
homem ao espaço. E nada disso surpreende esses jovens nasceram sob a égide
desses tempos e tudo pode acontecer a partir de dedos ágeis em teclados
sensíveis.
Triste.
Na curiosa
Índia, casas de castas sem cozinha, arriscam-se à comida de rua, alternada por
enjoada gastronomia mundial que serve vulgares bifes de vaca sobre ninhos de
rúcula com fio de azeite e flores comestíveis. Templos budistas se alternam em
shoppings centers magníficos no meio do deserto. Tudo coroado pelo olhar dos celulares, olhos
do mundo, que devassa a, antes valiosa, privacidade.
Tu te fizeste um colosso...
E o que se
sucede após esplendorosa explosão de saberes e desejos realizados? Uma estranheza
chamada pandemia COVID 19 que, além de morte e tristeza, provoca o horror ao
derretimento da economia. Não bastasse a pandemia que levou o mundo ao
desespero, governos ao limbo, outros ao éden escondido, expôs as desigualdades
sociais e a pobreza extrema aos olhos enclausurados. E então... surge uma
guerra oriunda de inexistente diplomacia, diálogos incompreensíveis, dilemas adormecidos,
política incoerente e que só cabe aos déspotas disputarem.
Mas também te fizeste triste.
Todos temem
o caos, mas não sabem estabelecer a paz. E vivemos a dolorosa expectativa do
flagelo, do desvalio, do fracasso. Moribundos da esperança buscamos no horizonte
a expectativa do golpe de misericórdia. Todos sentimos a asfixia desta
realidade aterradora.
E o que
virá? Resta apenas esta retórica dúvida. Não me eximo deste momento em que é preciso
repetir nosso poeta:
Tu te fizeste um colosso
Mas também te fizeste triste.