quarta-feira, 8 de abril de 2020

Nossos jovens, Covid 19, Guerra russa, ucraniana, enfim, o século XXI chegou.


Flagelação de Cristo por Peter Paul Rubens (1577-1640, Germany ...
Reféns de nossas conquistas, teremos que revisar nossos olhares. A geração que vem sucedendo a de meus filhos e já inaugurou o século XXI, me espanta, mas ainda exibe a máxima ideia da perpétua evolução humana. E ainda jovens, consideremos: são inteligentes, criativos, bilíngues, para dizer o mínimo, capazes de façanhas tecnológicas espantosas e inimagináveis há poucas décadas. E, sim, tem mais: turbinados por proteínas e outros acertos da biomedicina, são ainda mais belos.

Mas... Sempre o “mas”, ouso dizer que, há tempos, me assolam versos magníficos de um poeta, digamos assim, doméstico, de seu poema Criatura e Criação:

            E agora, homem ingênuo, louco ou poderoso,

            Agora que por tudo isso exististe,

            Tu te fizeste um colosso,

            Mas também te fizeste triste.

 

Triste? Não!

Colosso!

Esta geração explode em energia e vigor. Nunca viveu tão extenso período de prosperidade material e de paz; tem, ao alcance das mãos o que desejar, já que tudo está pronto para o uso, tudo perfeitamente posto. Pode sonhar e até mesmo não-sonhar. Sua estética já superou todas anteriores, tanto que construiu uma antiestética, a antimúsica, a antipoesia, antiarte, e injetando nisso valores exóticos.

Triste.

O consumo passou a ser sua necessidade essencial, e a humanidade é capaz de desejar estranhezas como cores novas para cafeteira que requer capsulas indestrutíveis, enquanto debate a produção de canudos de bambu, para o bem do meio ambiente. Simbiose de ignorância e cinismo. E desejos realizados devem ser, necessária e acintosamente, expostos nos ambientes retos, secos, frios, de uma estética sem memória.

Colosso.

Geração colossal que cruza oceanos em céus nunca antes avistados.  As velhas espirais metálicas agora dispõem de som e imagem, a odisseia humana extrapolou há muito o computador que levou o homem ao espaço. E nada disso surpreende esses jovens nasceram sob a égide desses tempos e tudo pode acontecer a partir de dedos ágeis em teclados sensíveis.

Triste.

Na curiosa Índia, casas de castas sem cozinha, arriscam-se à comida de rua, alternada por enjoada gastronomia mundial que serve vulgares bifes de vaca sobre ninhos de rúcula com fio de azeite e flores comestíveis. Templos budistas se alternam em shoppings centers magníficos no meio do deserto.  Tudo coroado pelo olhar dos celulares, olhos do mundo, que devassa a, antes valiosa, privacidade.

            Tu te fizeste um colosso...

E o que se sucede após esplendorosa explosão de saberes e desejos realizados? Uma estranheza chamada pandemia COVID 19 que, além de morte e tristeza, provoca o horror ao derretimento da economia. Não bastasse a pandemia que levou o mundo ao desespero, governos ao limbo, outros ao éden escondido, expôs as desigualdades sociais e a pobreza extrema aos olhos enclausurados. E então... surge uma guerra oriunda de inexistente diplomacia, diálogos incompreensíveis, dilemas adormecidos, política incoerente e que só cabe aos déspotas disputarem.

Mas também te fizeste triste.

Todos temem o caos, mas não sabem estabelecer a paz. E vivemos a dolorosa expectativa do flagelo, do desvalio, do fracasso. Moribundos da esperança buscamos no horizonte a expectativa do golpe de misericórdia. Todos sentimos a asfixia desta realidade aterradora.

E o que virá? Resta apenas esta retórica dúvida. Não me eximo deste momento em que é preciso repetir nosso poeta:

            Tu te fizeste um colosso

            Mas também te fizeste triste.